Tuesday, January 18, 2005

A MOSCA & O MINISTRO

Noticia da Lusa:

“Ordenamento Território: Arquitectos criticam proposta de Programa Nacional”*

Por causa disto sonhei que era mosca.

Como é da natureza das moscas, fui atraído para um Ministério português, por estranha conveniência, para o do Ambiente.

Aí, sonhei com o Ministro, que acabava de ler essa mesma notícia, comentando em tom feroz:

Mas será que esta gente não aprende?

“A Ordem [dos Arquitectos] lamentou (…) que as suas sugestões para melhorar o documento não tenham sido acolhidas na proposta de PNPOT [Programa Nacional de Politica de Ordenamento do Território] ”* – Hah – exclamava então – queriam agora que o ministério do ambiente tivesse em conta a Ordem dos Arquitectos em questões de Ordenamento do Território! – e acrescentava enquanto batia com o molho de páginas num aranhiço que o observava do parapeito da janela - Imaginem a pretensão desta gente!

Enquanto pulverizava a sala com mata-moscas (o que me causou bastante mal-estar), continuava gesticulando com largueza - Reparem, a Ordem tem ainda o desplante de considerar a proposta “uma oportunidade perdida no sentido de dotar Portugal de uma política promotora da arquitectura enquanto interesse público"*.

Sentou-se por instantes, bebeu uma cola, atirou a lata pela janela e proclamou enquanto batia com as palmas das mãos nos braços da cadeira - Estes Arquitectos querem tudo!
Sim, “a proposta ignora uma resolução do Conselho da União Europeia que define que a qualidade arquitectónica seja tomada em conta no conjunto das políticas, acções e programas dos estados - membros”*

E então?

Que é que a União Europeia sabe de “qualidade arquitectónica”? Se olhassem para aquelas cidades horrorosas como Barcelona, Madrid, Paris, Praga, Amesterdão…… horrorosos!

Tu! – Vociferou para um estagiário escondido atrás de um vaso onde uma enorme árvore-da-borracha se desenrolava – ouvi dizer que andas a estudar arquitectura. Anda cá. Que propostas eram essas, hã?

- Hum – replicou o jovem universitário – “Uma dessas sugestões era melhorar o ordenamento do espaço rural, classificando o regime jurídico das estradas e caminhos particulares.”*

- E para que raio serve isso? – Interpolou o Ministro.

– Bom, é que, segundo a Ordem, “a inexistência desse regime jurídico dificulta o controlo das operações urbanísticas localizadas no espaço rural”*.

- Burro! Então e como é que seria com as autarquias, hã? Como é que se desenvolvia o interior do país sem dar liberdade criativa aos especuladores locais?

- O senhor Ministro já ouviu falar em património, calculo. Talvez devesse ser tido em conta…

- Que património?! – Inquiriu a autoridade.

- Monumentos históricos…

- Monumentos históricos constroem-se, seu lirico. Não percebes nada disto – o rosto ruborizado fazia adivinhar um enfarte a qualquer momento – os prédios são bons para a economia, e os Arquitectos não sabem nada de economia.

Quem sabe de economia – acrescentou enquanto esmurrava o teclado do computador – são os engenheiros!

Então, num ataque de fúria, desatou a atirar objectos na minha direcção, gritando – Essa puta dessa mosca já me está a irritar. Mas quem é que esses Arquitectos julgam que são? – Engenheiros?

Se calhar, agora querem ser Engenheiros! Não tarda nada também querem assinar projectos de arquitectura!

Num gesto abrupto pegou no telefone, escavacou as teclas com um lápis e gritou: Vamos lá a acabar essa gaita rapidinho. Não há cá debates para ninguém, quero a versão final no fim do mês, antes que estes lambões se lembrem que vai haver discussão pública.

- Tu – voltou a chamar o jovem quasi-Arquitecto

– Primeiro: Manda fazer os comunicados para a discussão pública do PNPOT.

Segundo: Essa árvore-da-borracha vai para o lixo. Atrai moscas.

Terceiro: Trata de inventar um texto bem ambíguo para os comunicados de imprensa sobre a discussão pública do PNPOT.

Quarto: Não quero ver publicado nem um comunicado de imprensa sobre a discussão pública do PNPOT. Arranja-te.

Quinto: Já que estás nas Arquitecturas, deves perceber de desenho: faz lá o design dos convites para o baptizado do meu sobrinho.

E agora põe-te a mexer que eu tenho que trabalhar.


Claro que, tudo isto não passou de um sonho…



* Texto entre aspas citado de: Fonte LUSA, Notícia SIR-6677519, Temas: ambiente Portugal, 18-01-2005 17:12:00.

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